Programa de intercâmbio pretende enviar 101 mil bolsistas para universidades estrangeiras até 2014. Para chegar lá, número de participantes terá de aumentar muito no ano que vem
Priscilla Borges - iG Brasília | 18/12/2012 05:00:00
O programa Ciência sem Fronteiras completou 17 meses de existência cumprindo 20% da meta de distribuição de bolsas de intercâmbio até 2014. Lançado em julho do ano passado, o projeto mandou os primeiros participantes este ano para instituições de mais de 30 países. Ao todo, 20.654 bolsistas de graduação e pós saíram do País até o início deste mês.
Quando lançou o projeto, a presidenta Dilma Rousseff anunciou que o governo federal (com o apoio de empresas privadas) enviaria 101 mil universitários para o exterior até o fim de seu mandato. Diante do cenário atual, a meta para os próximos anos se tornou ainda mais ambiciosa. Para a meta ser cumprida, os editais terão de ser multiplicados em 2013.
Além de aumentar as vagas substancialmente, os órgãos coordenadores do programa – a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) – precisam aprimorar processos de seleção, de escolha das universidades e dirimir a barreira do idioma para os alunos.
Essa é a opinião de estudantes que já participam do projeto e gestores do programa nas universidades brasileiras. O governo federal já reconheceu que a língua estrangeira – especialmente a inglesa – é a maior barreira para os candidatos do programa. Fez, inclusive, uma promessa de investir de forma maciça em cursos de inglês gratuitos para os interessados. Nesta terça-feira, o ministro anuncia detalhes do novo programa Inglês sem Fronteiras .
Arquivo pessoal
Paula França passou 11 meses nos Estados Unidos em intercâmbio do Ciência sem Fronteiras: conhecimento pode ser dividido
Leandro Tessler, assessor do reitor para projetos de internacionalização da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), acredita que o idioma estrangeiro é um dos maiores entraves tanto para enviar estudantes para o exterior, como para atraí-los. Está previsto no Ciência sem Fronteiras que alunos e pesquisadores também venham para o País.
“Precisamos trazer a língua inglesa para o mundo acadêmico urgentemente. Se não passarmos a ensinar em inglês nas nossas universidades, elas serão pouco atraentes. As pessoas querem ter a segurança de que o idioma não vai atrapalhar o aprendizado. Por outro lado, se ensinássemos em inglês, estaríamos ajudando também os alunos brasileiros”, pondera.
Na opinião de Tessler, receber estudantes estrangeiros é uma necessidade para as instituições.
Apesar de os Estados Unidos terem recebido o maior número de estudantes brasileiros (4.465), Portugal aparece logo em seguida, com 2.816 bolsistas. Na sequência, França (2.528), Espanha (2.297), Canadá (2.035), Reino Unido (1.801), Alemanha (1.611), Austrália (812), Itália (617) e Holanda (575) são os países com mais universitários brasileiros.
Desafios
Simone Uriartt, 23 anos, está vivendo na pele a dificuldade da língua e a importância do apoio para superá-la. Estudante de Design Visual da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), sonhava com uma experiência internacional. Manteve boas notas ao longo dos oito semestres de curso, mas o idioma a barrou na primeira tentativa de sair.
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Simone Uriartt e os colegas do curso preparatório de inglês: quem não tem o conhecimento exigido na universidade tem a chance de se preparar antes
A jovem se candidatou a uma vaga do Ciência sem Fronteiras no final de 2011, mas não conseguiu por conta da nota no exame de proficiência de inglês. Este ano, foi selecionada para a Nova Scotia College of Art & Design, no Canadá. Antes de começar as disciplinas do curso, ela está participando de intensivo de inglês, de quatro meses.
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“Vou ter a oportunidade de cursar dois semestres de Design. Recebemos a notícia no mês passado e foi motivo de muita alegria, pois quem não tinha tanto domínio do inglês vai poder cursar dois semestres em vez de um só”, comenta a estudante.
Além da língua, vencer a burocracia dos editais, que pedem muitos documentos, é outra dificuldade para os bolsistas. “A seleção dos alunos precisa ter critérios mais bem definidos e os bolsistas, mais assessoria. Principalmente na época da seleção, nos sentimos desorientados e perdidos”, conta Dayane Alves Quinteros, de 23 anos.
Dayane vai passar 10 meses na Universidade Complutese de Madrid. Estudante de Farmácia, acredita que sua formação será mais completa depois da temporada na Espanha. “É uma experiência incrível. Já tenho planos de, no mestrado, ir para os EUA. O programa abriu portas e vai certamente contribuir para o desenvolvimento do País”, diz.
Andreas Grings, de 20 anos, faz coro à necessidade de aprimorar os processos, que ele diz já terem melhorado. Ele tentou se inscrever em outro edital antes de garantir uma vaga na Alemanha. Segundo o estudante de Geologia, as informações não eram tão claras, a quantidade de documentos exigidos enorme e o prazo para apresentá-los, exíguo.
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Andreas Grings acredita que a burocracia dos processos está diminuindo e vê na experiência uma oportunidade de crescimento profissional
Para Andreas, só o inglês não basta mais no currículo. Por isso, decidiu aprimorar o alemão. “Estudar aqui também está me ajudando a definir meu futuro profissional, tenho a chance de fazer disciplinas diferentes das do meu curso na UFRGS. Estou tendo a chance de estudar em uma universidade que tem 700 anos, isso é muito legal”, afirma.
Choque cultural e saudades
Os estudantes ouvidos pelo iG dizem que, depois de instalados, burocracia e dinheiro não foram problemas. As bolsas recebidas pela Capes são suficientes para manter as despesas básicas e a recepção nos países foi bem feita. Algumas instituições realizaram até seminários para explicar o funcionamento da universidade e os hábitos do país.
Difícil mesmo, sentencia Paula Stapenhorst França, de 23 anos, é ficar longe de casa. Aluna de Engenharia de Produção, ela passou 11 meses nos Estados Unidos. Voltou na semana passada. “É necessário se acostumar com muitas mudanças ao mesmo tempo. Mas o mais difícil foi ter de lidar com a saudade do Brasil, da família, dos amigos e do namorado”, admite.
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As oportunidades de participar de congressos, competições de pôsteres científicos e fazer estágio no laboratório da faculdade superaram as dificuldades. “O programa ajuda os alunos a melhorarem o domínio da língua, importante para o mercado. A experiência que os alunos trazem ainda pode ser compartilhada para outros, difundindo conhecimento”, defende.
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Paula Krebs, estudante de Nutrição, sentiu o impacto da diferença cultural com os italianos na chegada à Milão. Agora, já se sente em casa no país
Paula Zart Krebs, de 20 anos, estudante de Nutrição em temporada na Itália, conta que alunos e professores da universidade de Milão em que está matriculada não foram muito receptivos. Isso dificultou a adaptação da jovem. “Aqui as pessoas são muito introspectivas. No início, isso é complicado, pois estamos mais frágeis com todas as mudanças”, analisa.
Há três meses no país, o período de adaptação já passou. Ela já diz se sentir em casa por lá. “Sempre tive interesse na Itália pela cultura, culinária e história. Fazia italiano há alguns anos e pensava em viajar para o país. Crescemos com as dificuldades, as novas responsabilidades e aprendizados. Sem dúvidas repetiria tudo”, garante.
Novas áreas
Este ano, o programa também recebeu inúmeras críticas por conta das áreas que atende. As engenharias, tecnologias e cursos de exatas têm prioridade desde a concepção do projeto. No entanto, os estudantes das áreas de humanas reclamam da discriminação e da “exclusividade” das bolsas para essas áreas.
“Acho natural ter essa prioridade, porque é uma carência do País. Mas acho recomendável ter um número de oportunidades também para estudantes de Humanas”, pondera Leandro Tessler, da Unicamp.
O programa se tornou alvo de
processo judicial por conta da retirada da atual chamada de edital 24 cursos, sendo 20 deles da área de Humanas, que faziam parte do programa. Dois dias antes da abertura da segunda chamada houve uma retificação. Por conta disso, universitários alegam que foram lesados financeiramente e procuraram a Justiça Federal.